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C6Festival - São Paulo. 17-19/05/24
"No final de semana dos dias 17-19 de maio, o parque do Ibirapuera em São Paulo foi parcialmente tomado pelo “C6 Fest” em sua segunda edição, que trouxe uma série de apresentações inéditas para solo brasileiro com representantes do pop, soul, hip-hop, funk, blues e mais.
O primeiro dia foi realizado no Auditório do Ibirapuera, com foco em músicas menos convencionais e com forte influência do jazz, do erudito e pitadas do rock; a musicalidade indo além do senso comum de versos e refrões, mais focada nas paisagens sonoras que preenchem o ambiente e levam o espectador à lugares novos, fora do convencional cotidiano, este é o caso com Daniel Santiago & Pedro Martins, que abriram o festival, além de Jakob Bro, dinamarquês que encerrou a noite. São sons imprevisíveis, que constroem e desconstroem ideias e sensações na mesma rapidez que mudam os acordes. Os outros atos da noite, Charles Lloyd Quartet e Jihye Lee Orchestra trouxeram abordagens mais clássicas diretamente das costas Leste e Oeste da terra de Tio Sam.
Oficialmente para muitos, o segundo dia de festival era o verdadeiro começo, mas antes de adentrarmos oficialmente nas especificidades de cada show, vale destacar sobre a estrutura e os “palcos”: “Tenda Metlife”, “Arena Heineken” e o “Pacubra”, cada espaço com uma proposta diferente e única ao público: a Tenda Metlife era uma estrutura coberta (que foi uma excelente escolha, levando em conta a instabilidade do tempo de São Paulo; por sorte, dessa vez não choveu na terra da garoa) que preconiza maior intimidade entre público e artista, com reverberação do som como se estivéssemos numa bolha própria; a Arena Heineken, por sua vez, era a plateia externa do Auditório do Ibirapuera com maior capacidade de público, com excelente destaque ao uso de iluminação e projeções dinâmicas que exploravam as apresentações como experiência multimídia muito além do “apenas musical”; por fim, o PACUBRA foi realizado no Pavilhão das Culturas Brasileiras, um espaço fechado feito de pista de dança para música eletrônica.
No sábado, chegamos durante o set de Jaloo & Gaby Amarantos na Tenda Metlife, que logo deram recado sobre a importância da representação brasileira no festival e animaram o público com constante bate bola e interações. Gaby levou seu som Grammyzado e Jaloo uma excelente retrospectiva de sua carreira, incluindo o álbum mais recente “Mau”.
A britânica Romy, famosa como parte do projeto “The XX”, também se apresentou na Tenda Metlife com um híbrido de DJ Set e Performance vocal; um cuidado primoroso em costurar a experiência do público com a expertise técnica. Mesmo com o sol ainda presente, a cobertura da tenda junto com sistema de som criam uma atmosfera elétrica, a tal “bolha” citada ali em cima.
Para chegar à Raye em tempo, me despeço mais cedo do show de Romy e sigo em direção à Arena Heineken, uma boa caminhada pelo parque Ibirapuera. Vale ressaltar que, para acessar cada área (“palco”), é como se você entrasse e saísse do festival diversas vezes; são áreas distintas e separadas pelo Museu Afro Brasil, que você contornava e passava por um novo controle de verificação de pulseira (“ingresso”) e revista para garantir segurança de todos. Inclusive, para melhor controle da situação, logo na saída da Arena Heineken, existia um totem eletrônico mostrando a lotação da Tenda Metlife em porcentagem.
De volta aos shows, Raye começou sua apresentação pontualmente às 18:30 e conquistou o público de cara com charme, carisma e talento: é impressionante a sutileza com que a britânica consegue deslizar entre vocais impressionantes e anedotas sobre a vida e sua carreira musical, um diálogo constante com público e banda, sempre tentando manter controle do tempo restante de palco. “Soube que vocês são um público incrível” ela dispara ao público, que responde com rugido, assim como o coro de “Eu te amo” que ela responde “Eu te amo? O que é isso?” - “I love you” - seguido de um sorriso sincero.
Tais habilidades fazem parecer fácil manter o público na palma da mão, mas os olhares mais atentos reconhecem que a jovem tem um talento nato para o palco, não à toa que após os problemas com sua gravadora, ela conquistou o mundo de maneira independente. Com pouco mais de 12 músicas, não faltaram os hits como “Prada” e “Escapism” ou ou canções que levam o público a refletir; a voz ecoa e flexiona para cada emoção e, mesmo nas músicas mais agitadas, é possível perceber o blues que permeia o trabalho de Raye. O auge, talvez, tenha sido “Ice Cream Man”, onde Raye introduz a canção sem rodeios e de maneira franca - “é uma canção sobre assédio sexual” - e deixa sua voz seguir.
Com um breve intervalo entre apresentações, o encerramento da Arena Heineken (e de nosso segundo dia) ficou com o duo Black Pumas; plateia cheia e engajada com a mistura de Rock e Soul que permearam o set. A maior surpresa da noite, em geral, é quando Eric Burton salta do palco em direção ao público e sobe na barricada para sentir o amor brasileiro de pertinho.
Entre o repertório que inclui dois discos lançados, ainda coube um cover de “Fast Car” de Tracy Chapman, suficiente para cativar qualquer um que não conhecesse o trabalho autoral da banda antes da exposição proporcionada pelo C6 Fest. “Colors” e “More Than A Love Song” também foram presença confirmada, suficientes para reações honestas da plateia que se abraçou e comemorou em união: era notável o volume de pessoas ocupando o gramado da Arena Heineken até os fundos.
Para o terceiro e último dia, começamos com Noah Cyrus que moveu uma legião para Tenda Metlife: mais uma prova que o sangue Cyrus carrega um gene especial, mais um talento nato que sabe entreter o público. Apesar de não ter a mesma quantidade de hits que os familiares, ela mostra sua desenvoltura própria e independente, não sendo possível realizar comparação além das (poucas) semelhanças vocais e o excelente trabalho com público. O repertório é baseado principalmente no álbum de 2022 “The Hardest Part” e ainda a famosa “I Got So High I Saw Jesus” que resultou em muitos braços jogados pelo ar, com melodia forte o suficiente para manter qualquer um cantarolando após o fim do show.
Outro momento brilhante do festival foi o “Baile do Cassiano”, com participação de Fran & Preta Gil, Luccas Carlos, Liniker e Negra Li; uma reunião para o gingado do público e que demonstra a potência nacional que vem sendo explorada pelos festivais de música.
Preta Gil lembrou que estava presente na última edição como espectadora, ano passado, durante um período de cura, dizendo também que o poder do festival ajudou a curá-la - “e espero que, esse ano, também cure vocês que precisam!” - seguido por uma salva de aplausos.
A americana Cat Power trouxe à Tenda Metlife seu espetáculo em homenagem a Bob Dylan, convergindo diferentes públicos entre fãs próprios da cantora e admiradores do ícone da música. Após uma breve chuva de aplausos do público, o silêncio paira e apenas a voz e guitarra ecoam pelo espaço, com todos vidrados antes da explosão elétrica que divide o set após as primeiras músicas.
Young Fathers, na Arena Heineken, presentearam o público com um espetáculo embebido de psicodelia e percussões frenéticas (pessoalmente, a melhor descoberta do festival) com muita harmonia vocal; simplesmente impecável a coordenação entre música, visuais e performance, de longe o melhor uso das projeções na fachada externa do Auditório e o público respondia na mesma intensidade.
O maior problema da edição aparentemente foi o encavalamento de shows, uma vez que não era informado o horário final de cada apresentação e o público interessado precisava caminhar entre os espaços antes do final de cada show, nesse caso, impedindo de prestigiar o final de Young Fathers mas em direção de um dos grandes nomes da cena rock alternativa da década de 90: Pavement!
Apesar de chegar com o show já acontecendo, era impossível não entrar na vibe automaticamente com os fãs jogando cabelo, pulando e erguendo os braços, digno de uma roda de rock. É visível o jeito rústico da banda que comanda o palco com seus instrumentos; as guitarras e distorções, a bateria pesada, tudo é ampliado pela acústica da Tenda Metlife e é palpável a sensação de realização dos fãs.
Daniel Caesar, encerrando a Arena Heineken no último dia de festival, trouxe uma experiência diferenciada ao festival, incluindo a maior produção de palco entre os três dias de shows; um rig de iluminação erguido ao centro, acompanhado de cortinas que são recolhidas ao topo, junto de um grande telão de fundo. Diria que foi o ato Solo que trouxe maior plateia, ou então os mais fervorosos, que puxaram coros antes mesmo do espetáculo começar, os mesmos com humor das redes sociais, que berram “Daniel Salada” e surtam ao menor sinal de que algo está prestes a acontecer no palco.
O espetáculo seguiu, incluindo o hit “Best Part” que dominou as redes sociais como viral e ainda houve espaço para um cover de “Sparks”, do Coldplay. Os arranjos eletrônicos casam perfeitamente com o R&B minimalista e o show de desenrola num ballet constante entre artista, telão e público. Ao fim, o show se encerra da maneira que começou: seguindo o artista pelos corredores até que ele canta a última música diretamente do camarim, seguido da despedida em português - “Tamo junto!”.
E assim parece encerrar o C6 Festival, criando imagens memoráveis para aqueles que vivenciaram a experiência. “Parece encerrar”, já que, na verdade, ainda rolaria mais dois shows “exclusivos” novamente no interior do Auditório, mas somente para aqueles que compraram o ingresso “separado” que também deu acesso ao primeiro dia de festival. Após 3 dias intensos, acabo optando por encerrar nossa cobertura em tempo real do Instagram (lembrando que tudo se encontra lá, nos destaques, para quem quiser reviver as fortes emoções).
No caminho de volta para casa, já do lado de fora do Ibirapuera, é impossível não perceber a satisfação das centenas de fãs e admiradores que contam e recontam, entusiasmados, a experiência de prestigiar o ídolo em grupo. Entre as conversas, algumas jovens percebem que compartilham, além da paixão por Caesar, a mesma vizinhança, apesar de nunca terem se visto antes… acho que essa é parte da magia dos festivais de música."
Leonardo Rodrigues para Vou De Grade
Registros do "C6 Festival 2024" realizado no Parque do Ibirapuera, em São Paulo.


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